Vida de Trabalhador, não é mole não !

Conheçam a história de Sr. Gerci, vendedor de cloro da favela do Jacarezinho.

Gerci de Mello Alves, 51 anos, morador da favela do Jacarezinho.

Senhor Gerci serviu o exército no ano de 1978, cumpriu pena de 3 anos e 8 meses de cadeia. Atualmente Gerci está aposentado e encostado pelo INSS, adora fazer esportes principalmente corrida, na qual já participou de várias delas como a meia maratona do Rio e a São Silvestre em São Paulo.

Gerci treina duas vezes por semana no campo da GE (Jacarezinho) e uma correndo pelas ruas do bairro da Tijuca, são mais de 5 horas de treinamento intensos. Evangélico desde 1991 e participante da Igreja Universal do Reino de Deus do Jacarezinho,ele é pai de três filhos cujo um deles esteve no Haiti recentemente com as forças armadas brasileiras.

Na verdade muitos dos moradores não o devem conhecer por esse nome. Porque além dele fazer tudo isso, senhor Gerci vende produtos de limpeza por toda a extensão do Jacarezinho e pelo bairro de Maria da Graça, onde é conhecido como “O Casa Cheirosa, Marido Feliz”.

Sr. Gerci com seu carrinho de cloros

Fato esse muito por conta dele sair pelas ruas anunciando seus bordões para a venda de seu produto de limpeza, no qual geralmente é o famoso “Cloro Branco do Marido Feliz”.

“ Sr. Gerci tem uma vendinha onde ele guarda e faz a mistura do seu cloro. Ela fica na Rua Getúlio Vargas s/n – Jacarezinho. Local onde quem passar por volta das 7 da manhã verá ele lá fazendo e arrumando as garrafas pet com cloro no seu carrinho de mão.

Sr. Gerci preparando seu cloro para mais um dia de vendas.

 

E assim ele segue em frente sua caminhada, que já leva mais de 15 anos, Sr. Gerci valoriza muito o trabalho e o trabalhador, apesar de toda dificuldade que se possa ter no dia a dia tão movimentado, não tem cansaço nem mau humor que o faça parar.

Ele desce a favela do Jacarezinho cantarolando vários de seus bordões que já são conhecidíssimos por toda a favela. Sempre com muita alegria e empolgação ele vai dando bom dia aos seus clientes e não clientes de um modo bem humorado.

Por onde passa se pode ouvir de longe um “ Alô povão agora vai, Acorda gente !” , um dos mais engraçados “ Ai ai ai ui ui, sorria !” ou então o que todos conhecem “ Chegou o Casa Cheirosa Inovando Brasil, Jacarezinho!” e por aí vai.

Sr. Gerci tem um repertório de bordões que brincam com o sentimento das mulheres, dizendo que se “A casa está cheirosa, o marido está feliz”. “Que se a casa está cheirosa o marido está contente, e assim ele dá presente”.  O que de maneira nenhuma é levado à sério pelas mulheres, muito pelo contrário elas acham tudo muito engraçado e que essa é uma forma divertida de mexer com elas.

Sr. Gerci com seu carrinho do cloro branco

 

Sr. Gerci conta que seu trabalho é “Rala, rala” tem que ir cantando, batendo na porta, tocando campanhia e oferecer mesmo. Pra ele a propaganda é a alma do negócio, O fato de Gerci ser um homem bem educado e brincalhão o ajuda com os moradores dos locais onde passa, pois todos vêem uma garrafa pet e acabam pegando para ele, o que facilita o andamento de seu trabalho.

Os cloros do ” Casa Cheirosa, Marido feliz”

 

O cara é um amante por futebol e pela natureza, sem falar na música. Flamenguista nato, por onde passa zoa seus “adversários” tricolores e alvinegros. A todo o momento ele anuncia “Flamengo, Flamengo!” o que deixa seus queridos clientes bem irritados no bom sentido.

Com seu carrinho de mão sempre pesado ele chama, bate na porta, brinca, parece um garoto, agradece, brinca de novo mais uma coisa é fato e ninguém pode negar, o cara trabalha muito bem. Até hoje, segundo Sr. Gerci ninguém nunca reclamou de seus serviços.

O suor em seu rosto demonstra toda a valentia que esse homem de 51 anos de idade tem para prosseguir na vida. Figuraça sem igual é muito querido em toda a favela e respeitado o que pra ele significa muito.

“A vida é dura” essas são palavras do trabalhador que acorda cedo para ter seu arroz com feijão em casa, assim como muitos outros espalhados por aí a fora. Pra muitos a vida castiga, para Sr. Gerci ela castiga e ensina logo em seguida.

Sr. Gerci atendendo cliente na porta de sua casa.

 

A rotina do “Casa Cheirosa, Marido Feliz” é de segunda à sábado trabalhar nas ruas vendendo seu cloro, à tarde correr para manter a forma e à noite ir aos cultos em sua igreja. Ele deixa os domingos para descansar um pouco e levar seu filho mais novo de 7 anos para brincar no campo da GE e ver o jogo do seu mengão quando possível.

Sr. Gerci voltando para casa depois de mais um dia de trabalho.

 

E assim vai levando a vida, cantando e trabalhando como um bom brasileiro, morador de favela e com muito orgulho. Ao fim da manhã por volta de 12:00 ele sobe o morro com seu rosto molhado de suor, cansado, mas com a cabeça sempre erguida.

Sr. Gerci esbanjando alegria como um verdadeiro trabalhador

 

Texto: Léo Lima / Favela em Foco

Sobre Coletivo Favela em Foco

A história Tudo começou no ano de 2007 na favela do Jacarezinho, depois de jovens da comunidade experimentarem uma oficina de fotografia dada por Fabio Caffé e Rovenna Rosa, fotógrafos da agência fotográfica Imagens do Povo, do Observatório de Favelas. Oficina essa que fez despertar o olhar dos jovens, e assim decidiram se reunir para criar uma mídia alternativa. Documentando o dia a dia da favela do Jacarezinho, no conceito de cultura/arte e a falta delas. O projeto era financiado pelo Cenpec e o Itaú Social, nos quais disponibilizavam verba para a condução do projeto. O projeto era feito na Ong Saúde e Cidadania, na favela do Jacarezinho. Onde os jovens criavam pautas, com a intenção de criar uma revista, que seria distribuída sem custo algum aos moradores do Jacarezinho, e as comunidades próximas, além dos colégios, ongs, empresas próximas. O projeto foi batizado de “Jacarezinho em Foco” e foi criado justamente para levar informação verdadeira de um cotidiano de vida muito pouco explorado. E que essa informação fosse distribuída por outros meios de comunicação (vídeos, blogs, sites de relacionamento). Com a proposta real de mudar o estereotipo que ainda se tem da favela, e que os temas abordados nas pautas sejam vistos com mais sensibilidade. Mostrando para quem quiser ver que na favela existe sim, gente que faz e acontece, tem suas dificuldades como em qualquer outro lugar, mas vive com harmonia e felicidade no local onde nasceu, cresceu, que vive onde vive por opção, e não por necessidade. Eram 6 pautas abordadas, cada qual com sua peculariedade de informação. Os jovens se organizavam para ir nas casas das pessoas, e assim se familiarizando com os moradores da comunidade. Sendo que, depois de 2 meses de projeto e 1 edição criada, o projeto infelizmente não teve continuidade. Já que os financiadores não permaneceram devido a cláusulas no contrato onde se dizia que o financiamento só seria feito no inicio do projeto, e que logo em seguida deveria ser tocado sozinho. Ou seja um auto sustentamento no qual não foi pensado na criação do projeto. Assim sem verba, alguns do jovens do Jacarezinho disperçaram um pouco, outros por necessidade precisaram sair para arrumar emprego. Infelizmente não foi dado continuidade, mas os jovens que permaneceram focados no que queriam, não desistiram. E no ano de 2009 os poucos jovens que ainda sonhavam com o projeto, se inscreveram na escola de fotógrafos populares por intermédio do antigo e até então professor e fotógrafo Fábio Caffé. Assim foi se reascendendo a chama mais uma vez pela fotografia. Assim, sabendo da dificuldade de divulgação do até então “Jacarezinho em Foco”. O professor Fábio Caffé deu uma forcinha, e informou a revista Viração, lá de São Paulo sobre o trabalho que tais jovens haviam feito. Logo depois de 1 mês depois da conversa... surgiu o interesse da redação da revista de divulgar uma galeria de fotos dessa galera na edição. Bem, feito isso os jovens começaram a criar esperanças mais acessas novamente. E, começaram a se reunir junto com outros integrantes da escola, inclusive fotógrafos formados da própria escola, para dar continuidade no projeto. Enquanto os jovens começavam a se reunir para o que de verdade gostariam de fazer... Alguns exemplares foram enviados e apresentados aos alunos da escola de fotógrafos populares, em sala de aula. Foi ae que a emoção tomou conta de todos, e de principalmente dos jovens participantes do “Jacarezinho em Foco” era uma parte do sonho sendo realizado. O que serviu de estímulo para a galera, e depois de algumas reuniões foi criado o até então, Coletivo Multimídia Favela em Foco.
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6 respostas para Vida de Trabalhador, não é mole não !

  1. Thiago Carminati disse:

    Léo, ó texto está primoroso e com as imagens finalmente posso dar um rosto a esse personagem que com tanto carinho e respeito você vinha nos falando. Valeu, brou, belo trabalho!!!

  2. Érica disse:

    Enfim pude conhecer o “casa cheirosa marido feliz” rsrsrsrs.PArabéns pelo trabalho.
    Aliás, comentá-los é um prazer.

  3. Marcelo Resende disse:

    É Léo, vc está se superando nos mostrando essas
    incríveis histórias! Parabéns pelo grandioso trabalho!

  4. Pingback: Dia do Trabalhador « Favela em Foco

  5. Leonardo Bt disse:

    Pow Leo legal conhece mais essa historia
    isso pra mostra que tem grandes valores nas nossas comunidades vlw moleke abraço botinha

  6. Carlos disse:

    Tudo é primoroso, gente! Mas preciso mostrar este vídeo a um grupo de profissionais para que vejam a ousadia, a irreverência e a inteligência de quem o produziu, para não cairmos na mesmice em nossas produções. No entanto, o vídeo não está mais disponível no site observatório de favelas. Como posso encontrá-lo? Sou Carlos E. de Laet, assessor do Sindicato dos Bancários do RJ. Obrigado.

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